NEONOMICON, a mais recente obra-prima de Alan Moore. Leia minha crítica aqui:
NEONOMICON
Alguns comentários sobre a mais
recente obra prima de Alan Moore.
Alan Moore é sinônimo de
qualidade em HQ’s pra muitos leitores. Poucos são os que não gostam da obra do
mago inglês. Afinal, ele revolucionou a forma como os quadrinhos americanos
eram produzidas como poucos. Apenas algumas obras europeias eram feitas com o
mesmo esmero voltadas para o público adulto até então. Quando, nos anos 80,
Moore foi contratado pela DC Comics para
escrever o Monstro do Pântano, ele passou a fazer da revista mais do que apenas
uma séries de histórias de bem contra o mal, mas introduziu outros temas, e
outras formas de se discuti-los nas páginas de um gibi.
Anjos depois, o mundo dos
quadrinhos ainda não aprendeu a seguir direito os preceitos do mestre. E o próprio
Moore decidiu abandonar o mercado de quadrinhos, trabalhando apenas
esporadicamente em uma ou outra obra quando dá vontade. Uma dessas obras é
NEONOMICON, que chegou ao Brasil no ano passado, com pouco alarde, mas vendendo
feito água.
Segundo o autor, essa HQ foi
lançada apenas porque Moore devia ao imposto de renda, e precisava conseguir
algum dinheiro. Mas engana-se quem achar que o resultado foi um trabalho eito
nas coxas. Moore usou o seu toque de gênio para criar uma história que,
travestida de “um clichê de investigação sobrenatural”, se apresenta como uma
grandiosa história, cheia de referências ao escritor H.P Lovecraft, mas que
ainda assim possui várias de suas marcas autorais.
Na edição lançada no Brasil, que
começa tendo como introdução “O Pátio”, uma HQ que adapta um conto do próprio
Alan Moore, mas roteirizada por Antony Johnston, que mostra Aldo Sax, um agente
do FBI investigando uma série de assassinatos que podem ter ligação com o uso
de uma nova droga que está na moda entre os jovens de uma cidade. Sem grandes
novidades tanto na temática quanto no estilo, essa história seria facilmente
esquecida se, anos depois, Alan Moore resolvesse usá-la como base para
NEONOMICON. Alguns dos personagens e conceitos
desse conto adaptado acabaram servindo de base para a mini série.
NEONOMICON começa anos depois
dessa introdução, quando dois agentes do FBI Merril Brears e Gordon Lampers vão
investigar o que aconteceu com o agente que investigava os assassinatos em “O
Pátio”. Sax acabou enlouquecendo, e agora cabe aos agentes descobrir o que
aconteceu com ele. Os dois vão parar na cidade em que o agente Sax investigava,
e disfarçados de um casal praticante de orgias, acabam encontrando um grupo de
adoradores de um monstro lovecraftiano que pratica orgias com um ser meio
humanoide, meio reptiliano.
Carregado de cenas de violência e
sexo explícito, essa revista gerou polêmica nos EUA, quando de seu lançamento,
e mais polêmica depois que uma adolescente emprestou um exemplar de uma
biblioteca pública. Mas, polêmica a parte, a proposta da revista, segundo
Moore, era justamente mostrar o sexo de forma explícita e natural. Sabendo que
a revista possui toda essa “baixaria” (no bom sentido, claro!) é possível ver
que tudo o que está sendo mostrado não tem nada de chocante, mas o sexo está lá
de forma natural, mesmo tendo sido praticado por adeptos de orgias, e com um
monstro. Para os puritanos, pode ser um choque, mas quem não vê maldade nas
perversões, tudo acaba sendo apenas parte da história, algo natural. E é assim
que Moore trata do sexo nessa história. Chocante talvez seja o fato de esse
grupo ter relações com um monstro, ou mesmo serem assassinos. Mas nas cenas de
sexo, não há diferenciação no tratamento dramatúrgico da história, estejam os
personagens vestidos ou nus.
Mas o que faz de NEONOMICON um
clássico instantâneo para os fãs de Alan Moore é o modo como ele lida com a
história, os vários climas, que mudam de capítulo a capítulo, de cena a cena. O
primeiro capítulo é como se o leitor estivesse vendo um episódio de “Arquivo
X”. Mas o mini clímax que termina esse capítulo joga os personagens em uma
reviravolta na investigação que é como se inicia o capítulo 2, com os agente
encontrando o grupo que pratica orgias. Os capítulos 2 e 3 possuem quase o
mesmo clima sombrio do filme “O Silêncio dos Inocentes”. E o andamento da
história consegue transmitir um perfeito clima cinematográfico ao leitor. A
primeira aparição do monstro é uma aula de como usar os quadrinhos para criar
suspense.
O capítulo 3 é onde o leitor
aparentemente dá um tempo pra respirar. Enquanto a gente Brears está em
cativeiro com o monstro, o FBI está investigando o desaparecimento dela e de
seu parceiro. As cenas são intercaladas para dar ao leitor a noção de quanto
tempo pode ter se passado entre as cenas. Já o capítulo 4, final, é onde os
pontos são amarrados, mas não pense que o desfecho se dá de forma leviana. Pelo
contrário, Moore sendo Moore nos brinda com uma história onde, mesmo quando
está acabando, e as tramas sendo concluídas, ainda há espaço para novas
informações serem acrescentadas à história, dando mais credibilidade, e fazendo
a cabeça do leitor dar uns nós com as revelações que são acrescentadas. Coisas
que, durante a leitura, não fazíamos ideia de que haviam pistas sendo deixadas
pra nós, mas que ao serem novamente mencionadas, acabam ganhando um outro
sentido.
NEONOMICON é uma história que
talvez poucos leitores, mesmo fãs do escritor, considerarão como uma obra prima
dele, pois, com exceção de “Do Inferno”, a maioria das histórias dele eram
baseadas no universo de super heróis, pulps, enfim, as raízes das hq’s. Com uma
obra que mais se parece com as primeiras séries lançadas pelo selo Vertigo,
passada no “mundo real”, ele pode “enganar” alguns leitores fazendo-os pensar
que esta é uma obra menor. Ledo engano. Quem ler esta HQ vai ser brindado com
uma história cheia de significados, como a maioria dos trabalhos dele.
Outro ponto a se discutir: Alguns
críticos tem comentado que para entender muitas das referências contidas aqui, seria
preciso conhecer a obra de H.P. Lovecraft. Discordo. Talvez o leitor de
Lovecraft reconheça as referências mais rápido, mas alguém que nunca leu nada
dele, ou, como eu, leu pouco e nem gostou muito, dá pra curtir a história assim
mesmo. Algumas das referências são mencionadas pelos próprios personagens de
forma bem explícita. Mas, conhecendo ou não Lovecraft, é muito curiosa a forma
como Alan Moore faz com que a vida, a obra e o culto ao escritor se fundem
criando uma nova mitologia à obra de H.P. Lovecraft. Por isso, eu recomendo também a leitura da HQ
Lovecraft, de Hans Rodionoff, publicada pelo selo Vertigo, da DC Comics, para
quem não conhece nada da biografia do autor. Apesar de não ter ligação com a
obra de Moore, é um bom ponto de partida pra se conhecer um pouco da vida dele.
Principalmente ao saber que Alan Moore vai publicar uma “sequência” de
NEONOMICON, que se chamará PROVIDENCE, e vai ter o próprio escritor como
personagem. Com certeza, vem aí mais uma obra imperdível!
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