Uma sincera história autobiográfica sobre o relacionamento de Chester Brown com prostitutas. Leia minha crítica aqui:
PAGANDO POR SEXO
Quando foi lançado aqui no Brasil, em 2012, toda a crítica especializada em quadrinhos elogiou muito este trabalho de Chester Brown. Eu, particularmente, fiquei com “o pé atrás”, pois eu havia lido, anos antes, sua A PLAYBOY, e não havia gostado. Resolvi reler, e acabei gostando. Talvez o tempo, minha idade, e novos conteúdos quadrinhísticos tenham me feito entender melhor a HQ. Assim, fiquei curioso pra ler PAGANDO POR SEXO, oportunidade que só tive muito tempo depois do lançamento.
Mas, independente de quanto tempo levei pra ler, a nova obra de Brown é excelente, tanto como complemento do anterior, quanto como obra independente. Na verdade, as duas hq’s não tem ligação, além do fato de serem obras autobriográficas do autor, e terem o tema de sua vida sexual. Não é necessário ler uma pra entender a outra. Claro que, pra quem leu a primeira, a segunda parece uma continuação. Afinal, em “A Playboy”, Chester conta sobre sua descoberta do sexo através das páginas da revista, em sua adolescência, e acaba em sua vida adulta, com aparentes problemas com as namoradas.
PAGANDO POR SEXO mostra ele em sua vida adulta, quando, após ter problemas com a namorada, decide não ter mais relacionamentos sérios, e, quando precisar de sexo, recorrer apenas à prostitutas. No começo da HQ, ele menciona a mesma namorada com quem termina em “A Playboy”, mas a HQ não é sobre o relacionamento dos dois, mas a história começa bem depois disso.
A princípio, os dois terminam, mas continuam morando juntos. Apesar da situação estranha de ter de dividir o apartamento com a ex e o novo namorado dela, Chester não se mostra nem um pouco preocupado. Seus amigos (que parecem ser, na história, uma espécie de “consciência social”, tentando fazê-lo entender que suas atitudes não são iguais à do resto das pessoas)estão sempre tentando ajudá-lo, dando opiniões, e servem na história de elo de ligação entre “o estranho mundo de Chester” e o nosso modo de ser “tradicional”.
Após mudar para um apartamento sozinho, ele chega a conclusão de que provavelmente nunca mais vai se envolver romanticamente com outras mulheres, e começa a buscar prostitutas para ter sexo. E passa a viver assim, de forma tranquila, sem culpa, nem se prender às amarras da sociedade.
Com uma diagramação bastante tradicional, cerca de 8 quadrinhos por páginas, dispostos de forma quase sempre simétrica, e com um traço simples, meio “linhas claras”, meio cartunesco, Chester narra todos os anos de sua vida desde que abandonou o compromisso de relacionamentos, as várias prostitutas com quem teve relações, as formas de se encontrar uma garota de programa, e várias conversas com seus amigos, sempre contestando sua opção com das outras pessoas ditas “normais.”
E Chester Brown faz tudo isso com uma sinceridade impressionante. Poucas pessoas narraria as vida sexual de forma tão aberta quando a que vemos nas páginas desta HQ. É como se todo questionamento apresentado nessa HQ fossem nossos, e não do autor. Ele vive tranquilamente sua situação. Talvez por essa sinceridade é que ficamos absortos na leitura da obra, e passamos a entender o que o leva a procurar pelas mulheres da vida. Apesar de poucos de nós terem coragem de fazer o mesmo, dá pra entender os motivos que podem levar alguém a desacreditar dos relacionamentos amorosos. Mesmo que, em parte, isso se deva à apatia dele, que muitas mulheres podem achar desinteressante. Mas ainda assim, suas declarações sobre o amor romântico fazem sentido.
As conversas de Chester com seus amigos cartunistas são um ponto interessante. O autor dá liberdade à certas licenças dos fatos reais (poucas, como ele mesmo diz nos apêndices)para nos fazer questionar os pontos sobre relacionamento e sexo. Essas conversas sempre deixam algo no ar. Ele não usa o fato de ser o autor para dar sua opinião de forma conclusiva, como sendo o certo, mas faz o leitor participar da conversa, ao apresentar os vários pontos de vista para nossa reflexão.
Em contraponto com as cenas de conversa, as cenas com as mulheres na cama são quase “didáticas” (por falta de uma palavra melhor), no sentido de que ele narra como funciona o serviço de cada uma delas, as diferenças entre as que anunciam em revistas, as que vivem em bordéis, os preços, as idades, as novatas e as experientes, as que ficam mais amigas dele, as que nem querem conversa, as com quem ele se identifica a ponto de fazer amizade, etc. E até mesmo as que não o agradam, e as que tentam enganá-lo.
Chester não se intimida nem mesmo em retratar o seu próprio sexo, seja na dificuldade de manter a ereção às vezes, ou quando não está tão a fim de fazê-lo.
A forma como ele retrata essas cenas nos fazem olhar para a prostituição de outra forma. Se não com um olhar de aprovação, mas pelo menos passamos a compreender que são mulheres como qualquer outra.
Ao final da história, Chester Brown mostra que não quis fazer uma obra moralista, no sentido de nos dar alguma lição ou esclarecimento moral sobre o sexo, a prostituição, ou mesmo o amor. Mas apenas representar como funciona a busca pelo sexo, desvencilhado do amor, de forma crua e sincera. Nada mais que isso. Há vários apêndices onde ele comenta sua visão da prostituição, a regulamentação como profissão, e as diferenças entre o que se convém chamar de amor, e as diferenças entre a busca sexual. Esses apêndices são mais diretos no assunto, e podem nos fazer pensar seriamente sobre o tema. Mas, sem eles, a HQ funcionaria da mesma forma, como o relato sincero de um homem que sabe diferenciar amor de prazer sexual. Certo ou errado, é a sua escolha. Essa liberdade é o que importa.
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